Rodrigo Cunha e as mudanças no mercado editorial

30-08-2018

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As recentes notícias sobre a descontinuidade de alguns títulos da Editora Abril e da Editora Escala agitaram o mercado editorial.

No meio desse tsunami de novidades, a B4Tcomm convidou o Publisher da RAC Mídia, empresa que edita a revista Viajar Pelo Mundo e outras customizadas, para responder 4 perguntas que poderão orientar sua empresa a como seguir investindo e confiando nas revistas.

1) O mercado editorial brasileiro vem passando por transformações significativas nos últimos anos. Qual sua avaliação desse mercado hoje?

Rodrigo Cunha: Não é segredo para ninguém que o número de leitores vem caindo ano após ano, mas acredito, que assim como os livros, as revistas possuem o seu valor e terão o seu espaço no futuro. O número de leitores fieis caiu, fato, mas ao mesmo tempo, a nova geração vem, aos poucos, tendo acesso ao meio revista. É preciso entender cada vez mais o hábito de consumo e saber que aqueles números de 10 ou 20 anos atrás nunca mais serão atingidos, mas que o espaço existirá para aqueles que entenderem o seu negócio a fundo. A abertura de pontos alternativos, como cafés, postos de gasolina, supermercados, pequenos empórios e as próprias livrarias, vem mantendo as vendas e conseguindo garantir que o produto chegue nas mãos de quem interessa. É fato que outras mudanças estão por vir, como por exemplo, as que estão sendo feitas nas famosas “bancas de lata”, aquelas que encontramos nas calçadas. Hoje em dia elas não vendem apenas revistas e jornais, mas se tornaram pequenas lojinhas de mil e uma utilidades.
 
Mas a maior mudança, sem dúvida, ainda está por vir. A recente notícia da recuperação judicial do Grupo Abril, para muitos caiu como uma bomba no setor, mas para nós, que vivemos o dia a dia, era uma tragédia anunciada e que, sinceramente, demorou para acontecer. Não cabe mais aquele antigo modelo de gestão, redações inchadas e a famosa prepotência de quem se julga acima de todos. Infelizmente perdemos boas revistas, deixamos de ter acesso, pelo menos no meio impresso, a conteúdos interessantíssimos e que farão falta, sem dúvida alguma. Quantos amigos, profissionais competentes estão no mercado à procura de novas oportunidades! Mas de novo, era uma tragédia anunciada.
 
Poucas pessoas sabem, mas outra empresa do grupo, a Total Express, antiga DINAP, era quem detinha o quase monopólio da distribuição de revistas no Brasil. Para entender de forma resumida, quase 100% dos editores, independentemente do tamanho, entregavam para a Total seus produtos e ela se responsabilizava pela distribuição em todos os pontos de vendas do Brasil. Com a Recuperação Judicial anunciada e a dificuldade em receber os pagamentos que vinham se arrastando há anos, muitos editores estão buscando alternativas e aprendendo que é possível viver sem ela. Com isso uma nova cadeia de distribuição está sendo montada e mais do que isso, estamos todos aprendendo a fazer o negócio, cada um do seu jeito e dentro de suas necessidades e interesses. Um aprendizado e tanto, que no meu entendimento, só fará bem a todo o setor. 
 

2) Impresso e digital ainda disputam audiência ou os públicos já estão definidos e segmentados? Quem consome o quê?

Rodrigo: Não diria que disputam audiência. Tenho a certeza que cada meio tem a sua audiência e que em alguns momentos elas podem se sobrepor. De novo, e sem querer ser redundante, precisamos entender do nosso negócio. Não somos uma editora que faz revistas, mas sim uma empresa que gera conteúdo. Parte dele pago, óbvio, mas uma boa parte livre. O público que consome nossos conteúdos digitais tem um perfil mais jovem, mais imediatista e que gosta daquela notícia rápida, resumida e objetiva. Já o impresso vai em busca da informação, do conteúdo aprofundado e quer saber dos detalhes. Cada um tem o seu espaço, a sua forma de consumo e nós temos que arrumar um jeito de entregar o que eles querem, da forma que querem e ainda pensar como rentabilizar tudo isso. O que buscamos incansavelmente é uma plataforma sólida e de propriedade nossa. As mídias sociais mudam demais. Eu vivi a época do Orkut, que acabou, e hoje o Facebook não entrega 10% do que entregava no passado e quem sabe daqui 2 ou 3 anos estaremos chegando a mesma conclusão com o Instagram. Por isso, investimos forte em nosso site e nossos canais próprios, que vão se moldando às tendências e ao que o consumidor digital vem buscando. 
 

3) Num passado bem recente, disseram que o impresso iria sumir e que tudo seria digital. Que a internet reinaria absoluta e acabaria com o mercado editorial tradicional como os jornais e as revistas. Hoje sabemos que essa profecia não se concretizou e que alguns veículos, como a Viajar pelo Mundo, vêm ganhando mais espaço nos pontos de venda físicos e aumentando sua distribuição nacionalmente. A que você atribui esse crescimento e reconhecimento?

Rodrigo: Isso aqui é um pouco o que eu disse lá em cima. Os livros estão ai, claro que não temos leitores de livros como tínhamos há 20 anos, mas tanto os jovens quanto os mais velhos os consomem, certo? 
Com as revistas vêm acontecendo a mesma coisa, pelo menos no nosso caso. Os números da Viajar não nos impressiona, pois sabemos exatamente o que estamos fazendo e onde queremos chegar. Com a saída da Viagem e Turismo do mercado no último mês de agosto, aumentamos em quase 20% a nossa tiragem para a edição de Setembro, na expectativa de nos consolidarmos, ainda mais, como líderes do segmento. Aumentamos as praças de distribuição e estamos indo para locais que não íamos há mais de 2 anos. 

Nossa missão sempre foi entregar um conteúdo com excelência. Tudo que é publicado na Viajar é de fato viajado, na nossa redação o Google só funciona para pesquisas menos relevantes e no máximo checar uma informação. Nós visitamos os lugares e os leitores percebem isso. Como disse, não cabe mais amadorismo! Nossos leitores são exigentes e querem conteúdos sérios e com relevância. A Viajar Pelo Mundo é uma revista séria, não existe copiar e colar em nossa redação, somos uma revista auditada pelo IVC (Instituto Verificador de Circulação), pagamos por isso e entregamos o melhor que podemos fazer. 

Um ponto importante, e que começaremos a bater forte na tecla, é que precisamos incentivar o mercado a exigir o selo do IVC no meio revista. O custo de filiação é pequeno, não chega a R$ 300,00 por mês e o mercado PRECISA exigir isso dos meios impressos. Um anunciante precisa exigir que a revista entregue, de fato, o que ela promete e o IVC é a única garantia que ele tem para isso. Andam dizendo por ai que imprimem 10 vezes mais do que o real e isso não pode acontecer, afinal, o setor como um todo sofre e sem dúvida, atualmente, esse é o nosso maior risco. Afinal, você investe o seu dinheiro com uma promessa, mas na realidade o resultado será 10 vezes menor do que o prometido. 
 

4) O leitor de revista também se influencia pelos blogs de viagem? Como você vê a diferença entre esses canais?

Rodrigo: No passado ouvi dizer por ai que blog e revista eram concorrentes. Atualmente são mais de 2.000 blogs de turismo no brasil, algo surreal. Costumo brincar que a revista só vende bem porque a maioria dos blogs são ruins…rs. Na minha opinião, menos de 5% são bons blogs e talvez desses, menos de 50% conseguem ganhar direito a ponto de pagar as suas contas com o blog. Conhecemos uma boa parte desses bons e alguns nos ajudam a construir, mensalmente, a Viajar Pelo Mundo como colaboradores. Tenho muitos amigos blogueiros, mais do que editores de revistas, por exemplo. 

Acredito que exista uma troca saudável de leitores e interessados tanto nos blogs como nas revistas. É uma relação saudável para os dois lados.